Igreja Nossa Senhora da Boa Morte e Assumpção
No ano de 1856, a Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte adquiriu uma quadra na cidade de Limeira para a construção de um templo onde pudesse realizar atividades espirituais e de caridade. A Irmandade, elevada à categoria de Confraria em 1869, era formada por homens abastados do município, o que possibilitou que, em dois anos, a construção da Igreja fosse iniciada. Os primeiros riscos do projeto foram realizados por Francisco José de Araújo Silva, membro da Câmara Municipal e provável Confrade. Segundo Carità (1998 apud. ROSADA, 2013) a Irmandade construiu parte da Capela-Mor até a cobertura, mas, por falta de recursos, a construção não avançou muito. Foi então que o Barão de Cascalho, José Ferraz de Campos, importante fazendeiro local e um dos fundadores de Limeira, assumiu o financiamento das obras e se prontificou a construir as paredes em taipa e sua cobertura. Para erguer a construção ele cedeu, segundo registros de época, mais de 400 escravos de sua fazenda para ajudar na construção. A técnica construtiva utilizada, a taipa de pilão, era comum para construções de grande porte e nesta igreja as paredes possuem espessura de 90 cm a 1,35 m. Após a edificação das paredes de taipa, o cidadão Bento Manoel de Barros, primeiro Barão de Campinas e um dos principais cafeicultores do município, assumiu a construção da igreja até sua conclusão. Para ajudar nesta tarefa contratou o engenheiro e arquiteto florentino Aurélio Civatti para “corrigir” o traçado da igreja (BUSCH, 2007). Civatti ficou encarregado de dirigir as obras de construção do templo, das torres e do frontispício, dotando-o de rico acabamento, com elementos decorativos de madeira, talhas, douração e pinturas artísticas em paredes e forros. De formação artística italiana, Civatti trouxe para a construção muita qualidade técnica, utilizando a corrente estilística do neoclassicismo para a decoração interna da Igreja. O Barão de Campinas mandou trazer de Portugal paramentos, pratarias, imagens e o sino em ferro fundido, confeccionado especialmente para a inauguração da Igreja que aconteceria em 1868. Em 1873, o Barão de Campinas foi sepultado na capela-mor da Igreja, conservando-se até hoje sua lápide na base da escada. Na década de 1880, foi realizado um estudo para a reforma da fachada da Igreja, com projeto de Ramos de Azevedo. Este, porém, nunca foi executado. A fachada principal foi alterada, posteriormente, em 1893, após estar arruinada, sendo reconstruída por outro italiano, Ernesto Mugnani, agora em tijolos e com características ecléticas. Embora Civatti tivesse formação clássica, a decoração interna do templo apresenta os cânones da arte barroca, que, segundo Carità (1998 apud. ROSADA, 2013), há evidências de que os entalhadores que fizeram os altares da Matriz Nova de Campinas trabalharam também na Igreja da Boa Morte. Embora as talhas da Boa Morte sejam creditadas a Civatti, sabe-se que ele trabalhou com uma equipe maior e que, segundo pesquisas recentes (CARDOSO, 2020 apud. BERTO, 2021), os entalhes apresentam também grande similaridade ao trabalho do ituano Miguel Arcanjo Benício de Assunção Dutra, conhecido como Miguelzinho Dutra. Neste sentido, pode-se afirmar que o italiano atuou como responsável técnico no canteiro de obras, mas os trabalhos artísticos podem ser atribuídos a outros profissionais. Entre o final do século XIX e início do XX, a igreja sofreu algumas reformas, “como reparos no telhado, conserto do armário dos paramentos e alfaias, obras na escadaria em frente à igreja, substituição do gradil da entrada do templo por um portão de madeira, arborização e melhoramento do largo e reforma interna do templo” (ASSIS, 1899 apud. BERTO, 2013, p. 85). Em 1915, foi adquirido um paravento de madeira e vitrais para a entrada principal da igreja. Neste mesmo ano, foram comprados 40 bancos de ferro, com as iniciais BM, referência à devoção da Confraria. Além dos trabalhos religiosos, a Confraria se dedicou também ao ensino laico, com a criação em 1917 de uma escola primária gratuita, a Escola de Nossa Senhora da Assunção, que funcionou no andar superior da igreja e atendia alunos de diversas classes sociais. Na década de 1920, outras reformas aconteceram, como a substituição do assoalho de madeira por ladrilhos hidráulicos; a instalação de mármore nas escadarias, gradis e estrado do altar-mor; a substituição de instalações elétricas; e novas pinturas nos altares laterais. Em 1927, foi realizada nova decoração interna, encomendada ao pintor italiano Angelo Perillo, compreendendo a nave, capela-mor, capela de Nossa Senhora Aparecida e Sacristia, em paredes, forros, janelas, altares, bancos e móveis (BERTO, 2021). A Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte e Assumpção tornou-se em duas ocasiões sede da Paróquia, como Matriz Provisória, nos anos de 1870 a 1876 e 1949 a 1971, quando a Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores passou por demolição e reconstrução. A Igreja da Boa Morte teve grande importância em nível nacional, quando o Imperador D.Pedro II e a Imperatriz Tereza Cristina assistiram uma missa em 1886. Assim como nas atividades educacionais, a igreja também prestou assistência à saúde pública, quando funcionou como hospital de emergência durante a epidemia de febre amarela em 1892. Em 2007, o pároco à época realizou inúmeras reformas que descaracterizaram elementos importantes da igreja, como a substituição de parte dos pisos de ladrilho hidráulico da nave principal, a retirada de todos os forros de madeira originais de ambientes dos pavimentos térreo e superior e as repinturas inadequadas no altar-mor. Neste período, a igreja já encontrava-se em estudo para tombamento, sendo as obras realizadas à revelia, sem autorização do CONDEPHALI (Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio Histórico e Arquitetônico de Limeira). Este fato gerou um processo junto ao Ministério Público, sendo a Confraria responsável pelo cumprimento de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para realizar obras de preservação no imóvel histórico. Em 2016, a igreja foi tombada por meio do Decreto Municipal n.375, de 9 de dezembro de 2016, garantindo a preservação deste importante templo e de suas belas obras de arte integradas.
Documentos Correlatos
Não identificados
Referências
BERTO, João Paulo (org.). Guia do patrimônio cultural de Limeira. Campinas, SP: Faculdades Integradas Einstein de Limeira, 2021. e-book
BERTO, João Paulo. História, gestão e preservação: os bens culturais eclesiásticos na diocese de Limeira-SP. 2018. Tese (Doutorado em História) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, 2018.
BUSCH, Reynaldo Kuntz. História de Limeira. 3ª ed. Limeira: Sociedade Pró-Memória, 2007.
BUSCH, Reynaldo Kuntz. História de Limeira. Limeira: Prefeitura Municipal, 1967.
CARITÁ, Wilson José. Breve Histórico da Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte e Assunção. 2ª edição. Limeira: Edição do autor, 1998 (mimeo).
CARITÁ, Wilson José. A Igreja de Nossa Senhora das Dores de Limeira. Limeira: Sociedade Pró-Memória de Limeira, 1998.
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ROSADA, Mateus e BORTOLUCCI, Maria Ângela Pereira de Castro e Silva. A Igreja da Boa Morte de Limeira: Uma amálgama de conhecimentos forâneos. In: IX EHA - ENCONTRO DE HISTÓRIA DA ARTE - UNICAMP, 2013, Campinas. Anais... Online, 2013. Disponível em: https://www.ifch.unicamp.br/eha/atas/2013/Mateus%20Rosada.pdf. Acesso em: 19 abr. 2022.
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TSCHUDI, Johann Jakob von. Viagem às Províncias do Rio de Janeiro e São Paulo. São Paulo: Martins, 1953.